Estresse tóxico: 52% das crianças não conseguem dormir bem

A pandemia trouxe uma série de prejuízos às crianças – o sono entre eles. Especialistas explicam as causas desse problema

Por: Verônica Fraidenraich/Canguru News

Diferentes estudos mostram o impacto na pandemia na qualidade do sono de crianças e adolescentes

A pandemia mudou completamente a rotina das crianças, trazendo uma série de prejuízos à saúde física e emocional dos pequenos, afetando inclusive o sono deles. Quietos em casa, sem fazer atividade física, comendo mais e, muitas vezes, abusando do tempo nos eletrônicos, problemas como insônia, pesadelos, terror noturno e alterações no ritmo do sono se tornaram frequentes ao longo do último ano. Além disso, muitas crianças também estão mais resistentes a dormir sozinhas, exigindo a presença dos pais para adormecer ou quando acordam de madrugada.

Cerca de 52% das crianças apresentam problemas no sono, segundo estudo o estudo “Estresse tóxico infantil durante a pandemia de Covid 19”, que já ouviu mais de 4 mil pais e mães. Realizada pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), em parceria com outras instituições de ensino e pesquisa, a investigação também constatou que 51% das crianças têm cometido excessos na alimentação durante a pandemia e 72% estão sedentárias.

“Mais de 50% das crianças estão tendo problemas em muitas áreas, como alimentação, distúrbios do sono, alterações comportamentais, irritabilidade, angústia e transtorno de ansiedade”, comenta a coordenadora do estudo, a neuropediatra Liubiana Arante, presidente do Departamento de Neurodesenvolvimento da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e professora da UFMG.

Ela explica que esses problemas estão relacionados ao cenário adverso que as crianças estão enfrentando, que inclui um amplo leque de situações – da falta de contato com amigos e professores à sobrecarga e estresse dos pais, negligência afetiva e violência física e emocional. “Tudo isso gera estresse tóxico, que é quando a criança vive uma experiência adversa por um longo período de tempo sem o suporte de um adulto”, esclarece a pesquisadora.

Liubiana complementa que as crianças estão mais sedentárias e vivem uma rotina entediante, dentro de casa, muitas vezes sem contato com o sol e a natureza – fatores importantes para regular os hormônios –, e com excesso de telas. “Esses aspectos prejudicam muito o sono e com ele o desenvolvimento do cérebro, podendo trazer problemas como dificuldade de aprendizagem, déficit de atenção, irritabilidade e rompantes de agressividade”, afirma a especialista.

O estresse tóxico e as consequências no sono também são relatados em outro estudo, do Núcleo Ciência Pela Infância (NCPI). A pesquisa “Repercussões da Pandemia de Covid-19 no Desenvolvimento Infantil” afirma que “este contexto de estresse altera profundamente as atividades físicas e o sono, que são essenciais para o pleno desenvolvimento infantil”. Segundo a análise do NCPI, há inúmeras evidências da profunda influência desses fatores sobre a plasticidade cerebral e, consequentemente, o desenvolvimento cognitivo e emocional das crianças.

Para Rosana Cardoso Alves, médica neurologista e membro da Associação Brasileira do Sono, de fato houve um grande aumento de problemas com sono na infância e adolescência neste período. “É uma coisa gritante, estou atendendo famílias no consultório desde o início da pandemia e percebo que aumentaram muito as alterações e queixas de sonos das crianças”, relata a médica.

Confira os quatro distúrbios do sono que mais se agravaram durante a pandemia, segundo os especialistas:

  1. Terror noturno: A criança acordar de repente aos gritos, chorando forte, parecendo estar em pânico. Às vezes, ela chega a se sentar na cama e se movimentar, mas não responde às tentativas de acalmá-la. Na verdade, a criança não está acordada, mas dormindo em uma fase dita sono não-REM. O terror noturno acontece sempre perto do mesmo horário da noite e aparece mais em crianças até os cinco anos de idade, tendendo a melhorar com o amadurecimento do sistema nervoso central até a adolescência.
  2. Sonambulismo: A criança se senta na cama e murmura palavras sem sentido durante alguns minutos, voltando a deitar-se e a dormir logo em seguida. Em alguns casos, ela pode perambular pela casa. Não é preciso acordá-la, apenas encaminhá-la de volta à cama. O distúrbio costuma atingir principalmente crianças entre 3 e 7 anos. Para evitar acidentes, é importante manter as janelas fechadas e guardar em local seguro objetos pontiagudos e outros que possam colocar a criança em risco.
  3. Despertar confusional: Trata-se de um despertar parcial, em que a criança abre o olho, mas não interage nem sabe o que está acontecendo. Ela pode apresentar fala arrastada, sudorese e comportamentos como choro inconsolável ou agressividade. Em geral esse despertar dura poucos segundos, mas há situações em que leva até mais de uma hora.
  4. Pesadelos: São mais frequentes na segunda metade da noite. A criança acorda assustada e relatando alguma história assustadora. Os pesadelos raramente incluem fala, gritos ou andar durante o sono.
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