Você já pegou uma embalagem da mão do seu filho e terminou de abrir por ele, achando que ele não conseguiria? Muitas vezes, os pais impedem a criança de terminar uma ação, por achar que assim a estão ajudando, quando, na verdade, podem estar atrapalhando um processo de aprendizagem. Por mais que os filhos tenham dificuldade em concluir certas atividades, não devemos responder ou completar a tarefa por eles, explica Lívia Ciacci, mestre em neurociências e parceira do Supera, escola de estimulação cognitiva. Ela lembra que o cérebro das crianças está em formação e as tentativas e repetições são necessárias para o desenvolvimento de habilidades e aquisição de independência.
Se o filho chora frustrado porque a colega não quis emprestar o brinquedo no parquinho, por exemplo, o papel do cuidador não é distrai-lo ou procurar outro brinquedo para compensar a falta. “O mais correto é deixá-lo se expressar e validar seus sentimentos, explicando-lhe que entende a sua frustração por não ter conseguido o brinquedo que queria”, aponta a neurocientista.
Ela diz que auxiliar a criança com deveres e tarefas envolve fornecer suporte e orientação para que ela possa realizar a atividade por conta própria. “A maior diferença entre fazer por ela e orientá-la é que, ao incentivá-la, ela terá maior senso de responsabilidade, autoconfiança e aprenderá por si”, expõe Lívia. Claro que é importante oferecer ajuda quando necessário, mas antes vale incentivar que tente de novo. “Isso pode ser trabalhado dando instruções claras, oferecendo dicas e encorajando a persistência diante a desafios”, afirma.
Outra prática comum que pode prejudicar o filho – as comparações com irmãos, amigos ou outras crianças – tampouco é indicada. Segundo a neurocientista, quando excessiva, a comparação gera ansiedade e baixa autoestima, e pode causar traumas que se prolongarão até a vida adulta, se não tratados previamente. “É crucial para o desenvolvimento saudável da criança que ela aceite a sua vulnerabilidade, e tenha um ambiente seguro no qual pode errar e acertar sem julgamentos e com acolhimento, sabendo que, no ritmo próprio, da maneira que ela conseguir, também será uma vitória”, descreve Lívia. Para ela, isso promove uma autoestima forte, permitindo que a criança explore suas habilidades e interesses de maneira autêntica. Na prática, fazemos isso quando encaramos com naturalidade e tranquilidade cada erro da criança, mostrando até onde ela acertou e que ela pode tentar de novo, esclarece a especialista.
Treinando o cérebro
Segundo Lívia, a inteligência abrange muito mais do que aptidões, mas sim um comportamento que pode ser treinado para a flexibilidade e criatividade. “Crianças são instintivas e têm a tendência natural de se espelhar nas pessoas que elas confiam e admiram. Por isso, para trabalhar com elas sobre as diferenças pessoais, por exemplo, é necessário ressaltar como cada ser humano é único e que nessa diversidade também deve haver respeito.”
Ela ressalta que é na infância que podemos explorar as formas que cada um aprende e para isso deve-se:
- Observar interesses e aptidões da criança e usar isso para motivá-la mais;
- Oferecer estímulos variados para a aprendizagem;
- Fazer brincadeiras que estimulem a integração e prática colaborativa;
- Ter sempre um diálogo com empatia e acolhimento.
“Em um primeiro momento, se a criança fica irritada ou brava, vale ensinar técnicas de regulação emocional como contar até dez e respirar fundo. Após esse primeiro momento de enfrentamento e acolhimento, é importante ter uma conversa saudável, mostrando que ela pode falar de suas frustrações de maneira construtiva sem recorrer à raiva. Mas não se engane, validar seu sentimento não é o mesmo que tentar evitar que ela sinta a frustração”, salienta Lívia.
Ela relata que quando, desde pequena, a criança entende que consegue fazer coisas sozinha, ela cresce mais resiliente, mais autoconfiante e tolerando as frustrações mais facilmente. “Por isso é importante resistir à tentação de fazer por ela e, em vez disso, dar dicas, apontar caminhos e, quando ela conseguir, comemorar junto”, conclui a especialista.