Como a ‘insônia das mães’ afeta a vida dos filhos

Excesso de preocupações, cansaço e quadros frequentes de estresse podem levar as mães a dormirem de forma insuficiente, aumentado a Irritabilidade e provocando sono irregular; para dormir melhor, a “higiene do sono” é recomendada

Por: Isadora Noronha Pereira /Canguru News

Sobrecarga na rotina e contextos de instabilidade e incerteza afetam a dinâmica do sono das mães

Conciliar rotina pessoal, cuidados e necessidades dos filhos e demandas profissionais pode causar uma sobrecarga intensa no dia a dia de uma mãe. Essa rotina pode interferir diretamente na qualidade do sono: com estresse diário e preocupações constantes, transtornos do sono podem ser desenvolvidos. Além de afetar a vida pessoal, a insônia das mães é capaz de influenciar negativamente a relação com os filhos e a qualidade do descanso das próprias crianças, apontam estudos recentes.

“A insônia  é essa condição em que as pessoas têm uma dificuldade de iniciar o sono, manter o sono ao longo da noite, ou acordam muito cedo e não conseguem retornar a dormir, fazendo com que haja uma insatisfação com o sono e consequências na vida”, explica Gabriel Natan Pires, médico e pesquisador do Instituto do Sono.  Ela pode ser desenvolvida a partir de doenças como fibromialgia e câncer, mas frequentemente possui relação com quadros de estresse e questões de saúde mental, como a depressão e a ansiedade, complementa o especialista.

Dinâmica familiar afetada

Se a rotina das mães é marcada por noites de sono de má qualidade, ou descanso por horas insuficientes, haverá consequências em cadeia na dinâmica familiar, sobretudo na relação com os filhos.

Além disso, a qualidade de sono dos próprios filhos pode ser afetada com a insônia das mães. Pesquisa feita pela Universidade de Warwick (Reino Unido) com 200 crianças entre 7 a 12 anos mostrou que filhos de mães com sintomas de insônia apresentavam dificuldade para cair no sono, dormiam por menos tempo e passavam menos horas em sono profundo. Segundo o estudo, essa relação pode ocorrer porque a maioria das mães ainda é a responsável por dedicar a maior parte do tempo aos filhos, exercendo influência maior e intensa no comportamento dos próprios filhos.

Segundo Dayanne Costa, psicóloga clínica infantil, toda a atmosfera de irritabilidade e cansaço mental também irá afetar na qualidade da relação que estabelecem com as crianças.

“Nessas condições emocionais, a mãe não consegue estabelecer uma conexão com o filho, e essa ausência de conexão emocional leva, por sua vez, a prejuízos no desenvolvimento psíquico da criança, que pode inclusive também desenvolver insônia”, relata Dayanne.

Ela ressalta que uma mãe cansada e sofrendo pela privação do sono não consegue exercer uma maternidade consciente e oferecer o suporte que o filho necessita para um desenvolvimento saudável.

De acordo com a psicóloga clínica e escolar Sirlene Ferreira, o comportamento natural das crianças poderá começar a irritar a mãe, afetando a relação materno-afetiva com os filhos. “Imagina uma mãe extremamente irritada junto dos seus filhos: crianças fazem barulho, fazem bagunça. Em que nível vai estar a paciência dessa mulher?”, indaga. Assim, a insônia das mães passa a ser um obstáculo capaz de dificultar a conexão com as crianças, pois lhes falta disposição e energia para nutrir todo o carinho e paciência constantes que teriam em cenários regulares.

 

Desequilíbrio emocional e psíquico

Uma boa noite de sono é essencial para que o indivíduo possa recuperar as energias gastas durante o dia, como explica Dayanne Costa. “Quando dormimos, além de descansar, nosso organismo realiza as principais funções restauradoras em busca de manter o equilíbrio metabólico, emocional e psíquico. A falta dessa boa noite de sono pode gerar cansaço, irritabilidade, ansiedade, fadiga, instabilidade emocional, entre outros problemas.”

No caso da rotina da maternidade, muitas vezes as mães estão a todo tempo com a necessidade de se manter ativas e atender às demandas dos filhos, especialmente nos primeiros anos de vida da criança. “A puérpera, por ser tudo muito novidade, ter um bebê recém nascido, vários medos do novo e a própria dificuldade do recém nascido de dormir, pode acabar não tendo horas de sono o suficiente para ela descansar, devido às demandas do puerpério. Em alguns casos, a mulher acaba se acostumando com a rotina de não dormir, e não consegue mais pegar no sono”, ressalta Sirlene Ferreira.

Muitas vezes, a mãe não dorme devido às próprias preocupações com a criança, e permanece constantemente alerta a qualquer sinal que ela possa apresentar durante a noite.

Esse descanso por tempo insuficiente ou de má qualidade interfere na qualidade das relações interpessoais da mãe. “Ela não possui um desejo de socialização, fica sem libido, vai perder o desejo em geral. Tudo que lhe dá prazer, ela vai refutar, porque está exausta”, completa Sirlene. A longo prazo, o distanciamento de momentos de socialização, cansaço frequente e falta de disposição para realizar atividades para si própria poderá ser responsável por despertar sintomas de ansiedade e até mesmo depressão.

 

Cuidados essenciais e tratamentos: como fugir da insônia?

Nesse contexto e ciclo vicioso, é possível que as mães passem pela rotina diária com sobrecargas mentais e físicas e fiquem sem saber por onde começar a buscar uma melhor qualidade do sono. Existem alguns cuidados que podem colaborar para que as mulheres alcancem um sono de melhor qualidade e fujam de possíveis transtornos, como a insônia. 

Para evitar que um sono desregulado evolua para um quadro de insônia, alguns comportamentos podem ser evitados. Segundo Gabriel Pires, um bom exemplo é evitar assistir TV e usar o celular em excesso logo antes de dormir. O especialista explica que, quando os pais possuem hábitos de dormir muito tarde, assistir TV já na cama e incluem a criança nessa rotina, ela pode desenvolver transtornos de sono e até a insônia também.

Caso a mãe já sofra de insônia, os tratamentos variam e buscam compreender a origem do transtorno no sono. De acordo com Gabriel, o uso de medicamentos só deve ser iniciado com a indicação e prescrição de um médico, pois, além de poder causar dependência, tratar a insônia com a medicação irá induzir um sono profundo, porém não natural.      

“O grande ponto é que o tratamento não deve ser a indução do sono de modo artificial, mas a identificação dos problemas que causam a insônia das mães, para que a gente tire eles do caminho e o sono volte a acontecer naturalmente”, explica pesquisador do instituto do sono.

Um dos métodos principais usados pelo tratamento com psicólogos é a Terapia Cognitivo Comportamental, uma forma de identificar as causas, traçar metas e “treinar” o cérebro para um sono mais profundo por meio da chamada higiene do sono. “São comportamentos simples, mas nem sempre fáceis de serem mudados, como dormir e acordar no mesmo horário, não ver TV e nem usar o celular na cama, não tomar café ou bebidas estimulantes próximo a hora de deitar, entre outras estratégias.”, diz Dayanne Costa.

Além disso, a psicóloga ressalta que é essencial que haja a formação de uma rede de apoio para a mãe nesse processo, para que um tempo de autocuidado e de olhar para si mesma e relaxar seja possível de ser incorporado na rotina. “Seja um banho relaxante ou 30 minutos de atividade física, isso já pode contribuir de maneira significativa para a qualidade de sono”. Desse modo, a mãe poderá cuidar de sua própria saúde mental e física, tornando- se uma mulher mais saudável e feliz, e estará mais disposta afetiva e fisicamente para estabelecer uma relação saudável com as crianças. Como consequência, poderá ser observada uma melhora em toda a dinâmica familiar.

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