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Seletividade alimentar: abordagem precoce e respeitosa favorece tratamento
Canguru News
Psicóloga destaca importância de oferecer uma alimentação variada e positiva na infância

Até 40% das crianças em fase pré-escolar apresentam algum grau de seletividade alimentar
Embora muitos pais associem a seletividade alimentar a “manha”, “frescura” ou fase passageira, estudos mostram que esse comportamento pode se consolidar como um padrão rígido quando não é tratado de forma adequada e no momento certo.
Segundo dados da Revista da Associação Brasileira de Nutrição (Rasbran), até 40% das crianças em fase pré-escolar apresentam algum grau de seletividade alimentar, mesmo sem diagnóstico de transtorno. O comportamento é marcado pela recusa persistente de alimentos, consumo restrito a poucos itens e resistência à introdução de novos sabores, cores e texturas — o que, ao longo do tempo, pode gerar dietas pobres em nutrientes e riscos como anemia, déficit de crescimento e obesidade infantil.
Juliana Moura, psicóloga infantil e especialista em comportamento, explica que esse cenário é mais comum em famílias onde o cuidado com a alimentação é terceirizado para babás, creches ou escolas que nem sempre contam com orientação técnica sobre como lidar com a seletividade alimentar.
"Há uma lacuna clara entre o que a criança precisa e o que de fato é praticado no dia a dia. Muitas vezes, a alimentação vira um campo de conflito ou de comodismo, e isso impacta diretamente o desenvolvimento saudável", afirma Juliana, que criou um projeto de atendimento em casa voltado a famílias com crianças pequenas em fase de seletividade alimentar. “A ideia é transformar o ambiente doméstico — onde a criança forma suas primeiras referências — em um espaço de aprendizado e vínculo em torno da alimentação”, diz.
Ela lembra que os primeiros anos da infância são críticos para o desenvolvimento de hábitos. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), 90% do desenvolvimento cerebral ocorre até os cinco anos de idade. "É nessa fase que as conexões neurais estão mais ativas. Se não houver exposição adequada a uma alimentação variada e positiva, a seletividade tende a se cristalizar como padrão."
A psicóloga também chama atenção para práticas comuns que, embora bem-intencionadas, podem reforçar o problema, como forçar a criança a comer, distraí-la com telas ou ceder a cardápios repetitivos. "Comportamentos assim geram aversão e reforçam o ciclo de recusa. A abordagem precisa ser respeitosa, técnica e ajustada à realidade daquela família."
Ela conclui: "Quanto mais precoce a intervenção, maiores as chances de reverter o quadro e evitar que o comportamento alimentar se transforme em um obstáculo duradouro. O mais importante é tirar o peso da culpa dos pais e substituí-lo por orientação qualificada."